BAIRRO DA BOUÇA

O BAIRRO DA BOUÇA COMO MODELO DE HABITAÇÃO SOCIAL

BAIRRO D’“O COMÉRCIO DO PORTO”

O BAIRRO D’“O COMÉRCIO DO PORTO”, PRECURSOR DA HABITAÇÃO SOCIAL

BANCO DE MATERIAIS DO PORTO

VALIOSO PAPEL NA REABILITAÇÃO URBANA

RE INVICTA

VALORIZAR O PORTO

REABILITAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO

O PAPEL DO CONFORTO AMBIENTAL

COMO EMPAREDAR PODE FICAR MAIS COLORIDO Parte I



Longe de promovermos ou de sermos a favor da política das habitações vazias e/ou degradadas acabarem com as entradas emparedadas, o nosso grupo nunca deixou de estabelecer uma reflexão sobre esse assunto tendo em conta a inevitabilidade dos muitos casos cuja legislação obriga mesmo a entaipar os imóveis quando não é possível, no imediato, proceder à sua reabilitação.

Não podemos deixar de notar que esta “nova moda” de emparedar trouxe para a cidade um ambiente mais cinzento notado pelos seus habitantes e visitantes que leva a uma descontentamento a nível moral e a um sentimento geral de desagrado. Mas num plano geral, aceitando o emparedamento, podemos exemplificar tendências que contrariam ou estabelecem determinadas soluções para que a cidade não fique tão cinzenta à custa deste fenómeno que despoja as habitações da sua inteira funcionalidade.


Como primeiro exemplo estabelecemos o caso real em que até a azulejaria ganha protagonismo e serve de solução para que uma nova linguagem se enquadre em perfeita harmonia com uma mais antiga. Trata-se das fachadas de uma antiga habitação que compreende os números 256 e 256 na rua Latino Coelho. A habitação original (com a fachada mais antiga do lado direito) foi projectada pelos arquitectos Arménio Losa e Cassiano Barbosa nos anos 50 do séc. XX para o residente Mário Amaral. Sofrendo diversas alterações ao longo dos anos, o seu interior acabou completamente demolido para dar origem a um parque de estacionamento.

A azulejaria e a pastilha, neste caso específico, servem assim de preciosos materiais cerâmicos que ainda hoje pode ser implementado na nossa cidade para nos garantir uma maior luminosidade que não atente contra a aparência degradada e cinzenta dos muitos edifícios velhos espalhados pela cidade. É um tema paradoxal, que compromete a nossa própria ideia mais respeitosa de reabilitação e que não pode ser aplicado a todos os outros exemplos; mas não podemos deixar de notar: os elementos cerâmicos e a sua expressividade podem ser belos, harmoniosos, coerentes com a decoração das fachadas – com a própria história da cidade do Porto, aliás – e no seu conjunto dão uma imagem mais colorida e de melhor impacto para a nossa cidade. 


Existem outros exemplos, claro, em que a arte e o design podem contribuir com uma melhor tendência na recuperação de fachadas emparedadas, pelo que na continuação deste mesmo tema iremos propor uma ou outra ideia no mínimo tão funcional quanto mais original.

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O VALIOSO BANCO DE MATERIAIS PARA A REABILITAÇÃO URBANA



O Palacete dos Condes de Balsemão, na Praça Carlos Alberto, alberga um valioso tesouro para a reabilitação urbana desde 2010, disponibilizando elementos variados de construção e decorativos oriundos da arquitectura da nossa cidade: Trata-se do Banco de Materiais da Câmara Municipal do Porto.
A existência deste banco visitável, aberto ao público, enquadra-se na nossa expectativa da criação de um banco mais alargado, disposto a recolher muitos mais elementos construtivos originais que actualmente estão degradados ou expostos nas habitações devolutas do Porto, podendo ser recuperados e reutilizados em futuras reabilitações de casas, tornando-as mais sustentáveis de acordo com um plano já concebido pela Associação Portuguesa para a Reabilitação Urbana e Protecção do Património — o “COLLECTED FROM”, candidato ao Concurso de Ideias de Inovação Social promovido pelo Centro de Inovação Social do Porto.


O Banco de Materiais não é só precioso nesse sentido; reunindo cerca de dois mil elementos de diferentes épocas de azulejos, estuques, placas de ruas, telhas decorativas, estatuetas, moldes de peças cerâmicas, estuques e outros elementos, não deixa de ter um valor informativo e pedagógico na interpretação da nossa arquitectura, permitindo vislumbrar como as nossas habitações são ricas e coloridas tanto a nível interior e exterior do ponto de vista histórico.


Através do seu legado cerâmico, no qual predominam os azulejos – desde exemplares mudéjares dos sécs. XV a um grande e variado número de exemplares nacionais dos séculos XVII, XVIII, XIX e XX –, também idealizamos de forma ambiciosa um possível Museu de Cerâmica do Porto, de forma a reaproveitar um edifício emblemático actualmente em desuso que possa expor a inúmeros visitantes um espólio maior de painéis de azulejos, louças, estatuetas e até outras peças de arte espalhadas (e ainda incógnitas) pela nossa cidade, dando a conhecer as suas origens, reunindo peças arqueológicas, mas relembrando igualmente o impacto de indústrias históricas tão importantes como a Fábrica de Devesas e a Fábrica do Fojo em Vila Nova de Gaia, ou a Fábrica de Massarelos e a Fábrica de Miragaia no Porto.
Reabilitar é o futuro, mas conhecer o nosso passado, para dignificar a nossa cidade, será o mais distinto passo.



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O BAIRRO DA BOUÇA COMO MODELO DE HABITAÇÃO SOCIAL

Entre a Rua da Boavista e a Rua de Águas Férreas, na cidade do Porto, encontra-se um dos pequenos bairros mais cativantes dentro do que é considerado um conjunto habitacional de carácter social. Trata-se da Unidade Habitacional da Bouça, projectada nos anos 70 do século XX no âmbito do plano de emergência SAAL – Serviço Ambulatório de Apoio Local – que procurou levar a cabo uma das mais ricas experiências no sentido de dar resposta às reivindicações populares do direito à habitação após a revolução do 25 de Abril de 1974.



Em 1975, o arquitecto Siza Vieira testa com esta unidade habitacional uma nova abordagem que, no mínimo, consideramos inspiradora. Com características particulares, este bairro social difere muito dos outros presentes na cidade do Porto por ter tido em conta o experimentalismo do SAAL que assentou em princípios cooperativos, entre os quais:
• O princípio da auto-organização e da iniciativa própria das populações locais, uma concepção de raiz ideológica que defendia este modelo como uma gestão dinamizadora mais democrática.
• O princípio da transição da autonomia para os moradores na gestão financeira e a participação activa dos mesmos nas opções tipológicas e na execução da obra.
• O princípio de possibilitar que os moradores possam recorrer ao sistema de auto-construção, tendo por base a convicção que o investimento pessoal, físico ou monetário, reforçava os sentimentos de apropriação do espaço da casa e do bairro. Este princípio também «garantia taxas de execução mais realistas, dado o enorme deficit habitacional no país.»
• O princípio da manutenção das localizações originais, arredando a hipótese de favorecer operações de especulação fundiária, ao mesmo tempo que permitia o acomodamento das populações em locais cujas «referências urbanas e de vizinhança já tinham sido adquiridas.»
• O princípio da descentralização administrativa e a disseminação equitativa dos técnicos pelo território nacional, procurando superar as políticas centralistas do Estado Novo.

As operações do SAAL duraram apenas dois anos, já que se extinguiram a 27 de Outubro de 1976, desviando-se a administração de conjuntos habitacionais sociais para os municípios. Apesar de tudo, não poderemos deixar de olhar para este exercício e perceber como pode ser importante do ponto de vista dos moradores o sistema de viver num sistema habitacional cooperativo como o Bairro da Bouça.
Neste caso particular, o conjunto de habitações leva em conta que o conhecimento técnico, o planeamento urbano e sobretudo a arquitectura devem-se colocar ao serviço das populações rasgando com o conceito de marginalização de moradores que podem ser integrados num dado espaço, convidando-os a participar na gestão e na manutenção de um local que pode beneficiar uma comunidade e contribuir igualmente para a coesão e o bem-estar individual.
O Conjunto Habitacional da Bouça procurou ser o menos dispendioso possível, recorrendo ao betão armado e a outros materiais de construção simples e abundantes, está integrado na malha urbana envolvente e contém 128 habitações dispostas em quatro blocos de concepção simples, com apartamentos duplex de 3 quartos, com pátios e espaços ajardinados. Dados os princípios do extinto SAAL, o pequeno bairro é considerado privado. Só foi terminado no início do século XXI, uma vez que durante o início da Democracia, nos anos 70, só foram executadas parte de dois blocos.


Os apartamentos acabaram adquiridos por moradores mais interessados em residir num apartamento desenhado pelo arquitecto Siza Vieira do que por pessoas de rendimentos mais modestos. No entanto, nada inviabiliza uma reflexão acerca dos princípios originais que o conceberam.
Imagine-se este precioso Conjunto Habitacional como um modelo para a concepção de novos bairros de habitações sociais na cidade do Porto, promovendo a integração, o cooperativismo e a auto-gestão dos moradores para benefício mútuo e sobretudo democrático.


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O BAIRRO D’“O COMÉRCIO DO PORTO”, PRECURSOR DA HABITAÇÃO SOCIAL



Uma das mais nobres funções da arquitectura, e das artes que a rodeiam, é o de proporcionar a melhor qualidade de vida possível num espaço e, fundamentalmente, no espaço da habitação. Quando isso se alia a trabalhar no sentido social para contrariar precárias condições habitacionais num meio urbano, o prazer tenderá a ser maior, assim como o desafio.
Assim sendo, relembrar o carácter progressista que foi do Bairro Social do Monte Pedral, mais conhecido por Bairro d’O Comércio do Porto, é recordar boas práticas.
Hoje em dia, poucos adivinhariam que este pequeno e aprazível bairro, organizado em três quarteirões, foi projectado na passagem do século XIX para o século XX, englobado numa parceria público-privada entre a Câmara e o jornal O Comércio do Porto que decorreu entre 1899 e 1905, segundo o desenho do arquitecto José Marques da Silva (1869-1947). Trata-se de uma interessante experiência, desenvolvida para dar resposta aos anseios de uma população operária que sofria com a falta de condições na cidade.

A partir da segunda metade do século XIX, a população do Porto sofreu uma brusca expansão demográfica que acompanhava o forte avanço industrial. A dada altura dava trabalho a mais de um terço desta mesma população. Isto criou um problema habitacional grave, que resultou em habitações de construção rápida, poucos salubres, sem saneamento ou abastecimento de água e instalações sanitárias dignas, quando existiam. Uma tipologia que se desenvolveu muito por esta altura foram as ilhas, das quais restam, infelizmente, alguns exemplos na cidade. Nessas ilhas amontoaram-se milhares de famílias operárias que viviam num considerável estado de pobreza que muito contrastava com as habitações de classe média ou das mansões elegantes nos bairros mais considerados da cidade do Porto. Além dessas ilhas, a crescente população operária teve de residir em autênticas colmeias humanas nas antigas casas do Porto, essencialmente na zona da Sé e da Ribeira, cada vez mais degradadas e sobrelotadas, com miseráveis condições.
As condições degradantes das habitações dos operários, amontoados em “ilhas” e “colmeias”, foram responsáveis pelo foco de várias epidemias, sendo que o caso mais trágico foi a epidemia de peste bubónica que proliferou rapidamente neste tipo de condições e que em 1899 dizimou mais de 10% da população urbana. Só esta negligência teve impacto suficiente para que se desenvolvesse, pela primeira vez no Porto, o conceito de bairro operário e/ou de habitação social.
Por iniciativa dos proprietários d’O Comércio do Porto nasce assim este bairro bem planeado em terrenos municipais. É um bairro operário onde um grupo de quatro casas forma uma unidade que experimenta o sentido de habitação colectiva sem comprometer de forma desequilibrada a individualidade de cada morador.


O Bairro d’O Comércio do Porto acaba por ser um rico exercício que explora a iniciativa civil numa política social, apostando num modelo progressista que veio a inspirar outras construções reconhecidas pela simplicidade, eficiência, sentido de individualidade, higiene, salubridade e sobretudo dignidade a que um morador de baixos rendimentos deveria aspirar.
Em termos práticos, o bairro não foi grande o suficiente para contemplar um número considerável de famílias, ou veio sequer a albergar as mais necessitadas, pois as habitações foram posteriormente entregues a trabalhadores de rendimentos mais elevados. Apesar do objectivo inicial, não deixaremos de reconhecer neste bairro o precursor de outros projectos similares que acabaram por ser construídos no decorrer da primeira metade do século XX, contrariando a habitação de operários em situações tão degradantes.



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